Sou ansioso, sempre soube disso. Ultimamente até comecei a tomar um medicamento para combater esta anomalia comportamental, mas parece que às vezes a genética fala mais alto. Afinal, sou filho do meu pai, sobrinho do meu tio e neto da minha avó materna, todos bastante ansiosos. E esses dias não deu, a ansiedade me corroeu por dentro por alguns minutos intermináveis. Uma ocasião besta, mas a ansiedade é assim, quando se manifesta, é difícil controlar.
O dia começou calmo. Estava no trabalho e às 10 da manhã, a convite do Fernando, colega de trabalho, participaria de uma reunião com um auditor que já conhecida, interessado em juntar esforços da instituição em que trabalha com a nossa para realizar um seminário sobre um assunto qualquer. O auditor é uma peça-rara, eu já havia me encontrado com ele uma única vez, o suficiente pra perceber seu estilo único de jesticular e falar. Talvez um pouco por não ser brasileiro, mas sim de um país da América Central. Como diriam os próprios falantes da língua espanhola, um tipo raro.
Eu gosto de reuniões de trabalho, elas quebram o clima do trabalho em frente ao computador e é sempre muito bom conversar com pessoas pra saber o que se passa em outras esferas profissionais. Geralmente elas duram uma hora e podem ser das mais variadas possíveis. Algumas são interessantes, outras já sabe-se desde o começo que não acontecerá nada de relevante, outras surpreendem. Existem pessoas mal-educadas em reuniões, pessoas simpáticas; alguns falam bastante, outros querem basicamente ouvir.
A reunião com o auditor, apesar de ter começado meia hora atrasada - problemas com o trânsito, ele justificou - trascorreu muito bem. O Fernando, porém, já havia me falado que não estava esperando nada de interessante. Dava mesmo pra perceber, enquando o auditor falava, um pouco animado, ele ficava desenhando quadrados e retângulos na beira de seu caderno de anotações. Não precisava disso, mostrar desinteresse de forma tão clara; forçou a barra, o Fernando.
No final das contas o Fernando teve que sair mais cedo por conta de outro compromisso e eu fiquei batendo um papo com o auditor, que ainda tinha algumas coisas a falar comigo. Quando eu achei que a reunião seria terminada, ele falou que iria ao banheiro e continuaríamos depois. Sem problemas, pensei. Mostrei à ele o caminho para o banheiro e fiquei aguardando na sala. Estava bem, a ansiedade nem demonstrava o mínimo sinal. Ele voltou, conversamos mais alguns minutos e deu a hora de ir embora, o horário de almoço estava se aproximando e meu estômago roncando. Porém, na hora de ir embora percebi que ele não queria realmente ir embora. Queria conhecer os outros escritórios do mesmo andar, todos vinculados de alguma maneira com a Alemanha: câmara de comércio, instituições de pesquisa, escritórios de turismo, banco (onde trabalho), etc.
Disse a ele que não conhecia muito bem o andar em que trabalho e acabei mostrando pra ele a sala de uma instituição de pesquisa e ciência, ao lado do escritório onde trabalho. Somente uma mulher estava trabalhando. Apresentei-os e começamos os três a conversar. Ele queria saber o que exatamente eles faziam, ela começou a explicar. Pelo sotaque, era alemã, como muitos do 3o andar. Já no início da conversa, a ansiedade começou a me atrapalhar, ficava mudando o pé de apoio toda hora, estávamos os três conversando em pé. E ele não parava de fazer perguntas; ela dava corda. De poucos em poucos minutos eu tirava o celular do bolso pra checar que horas eram, mas não estava interessado no horário em si, era automático. Quando a conversa chegava ao fim, o auditor arrumava outro assunto e o diálogo ganhava força de novo. Uma hora quase fomos embora, já estávamos nos despedindo, quando ele perguntou de onde ela era. Ao falar que era alemã, ele puxou papo em alemão, eu nao podia acreditar! O auditor havia morado muitos anos na Alemanha, começaram a falar da diferença de se morar no Brasil e na Alemanha, o clima, as pessoas, infra-estrutura, todas as diferenças que quem já passou pelo menos um dia em cada país está careca de saber. No verão era muito bom, eu sempre fazia churrasco com meus amigos, dizia o auditor. Enquanto isso a alemã falava do tempo gasto em São Paulo para se deslocar da casa ao trabalho. As pessoas, porém, eram mais amigáveis no Brasil. De vez em quando eu concordava com a cabeça e falava alguma coisa, não queria passar por chato e ficar como uma estátua no meio dos dois. Na verdade eu só queria sair de lá bem rápido, os dois já haviam conversado bastante. O papo vai acabando, mas o auditor recomeça: uma vez decidi viajar de carro com um amigo para o mar, fomos de última hora, logo depois voltamos. Percebi que até a alemã já estava ficando um pouco sem graça. Tinha notado também que o auditor queria algo mais e logo confirmei minha teoria: ele, antes de começar a trabalhar como auditor, se dedicou à ciência em algumas instituições na Alemanha. Havia entrado pro mundo das auditorias por acaso, o que gostava mesmo era de pesquisar. Nós não estávamos naquela sala por acaso. Não era à toa que ele encompridava o papo com a garota do escritório de pesquisa. Quando realmente não havia mais o que encompridar, finalmente nos despedimos.
Como sempre quando uma reunião acaba, levei o convidado até a porta de saída. As palavras de despedida são sempre as mesmas: obrigado por ter vindo, a gente vai mantendo contato, bom final de semana ou uma boa semana ainda, etc. Quando voltei para o escritório, estavam quase todos de saída para o almoço. Incrivelmente, em poucos segundos, minha ansiedade havia se dissipado, não havia nenhum traço sequer do anterior sentimento atordoante. Era hora do almoço, estava feliz, estava tranquilo.
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