quarta-feira, 4 de novembro de 2009

O Segundo Mundo: impérios e influência na nova ordem global

Parag Khanna é um jovem cientista político nascido na Índia e criado nos Emirados Árabes Unidos, Estados Unidos e Alemanha. Já trabalhou para instituições de peso como Foro Econômico Mundial em Genebra, Conselho de Relações Exteriores e atuou como assessor geopolítico das Forças de Operações Especiais dos Estados Unidos no Iraque e Afeganistão. Em seu recente livro, O Segundo Mundo, Khanna aborda a relação das maiores superpotências mundiais, China, EUA e União Européia, com os países denominados de segundo mundo - que mesclam características tanto de países desenvolvidos como de em desenvolvimento. As específicas análises de cada país, divididos em capítulos, nos dão noção de como a nova ordem global vai se desenvolvendo através de novas alianças, investimentos e conflitos entre os países.

No decorrer do livro, é perceptível a maneira, muitas vezes destoante, que cada superpotência explora sua política externa e desenvolve novas parcerias e programas de cooperação com as nações de segundo mundo. Os Estados Unidos, basicamente, praticam uma política externa baseada em interesses e demasiadamente preocupada com o terrorismo. Suas ações, diferentemente do bloco europeu, não conseguiram integrar economicamente o vizinho México, que há 20 anos era uma das maiores apostas do desenvolvimento econômico mas que não conseguiu decolar. Enquanto isso, a China vem fazendo acordos de cooperação e investimentos em infra-estrutura com inúmeros países em desenvolvimento de todos os continentes, recebendo em troca energia para continuar crescendo à mesma taxa. Sua atuação é muito mais expressiva que a dos Estados Unidos, e Pequim não se importa em negociar com diferentes tipos de regimes, mesmo que ditatoriais. Afinal, a China é uma ditadura: possui uma pujante economia de mercado onde o Estado controla basicamente tudo. Já a Europa, figura entre as outras duas superpotências com um modelo expansionista, arquitetando políticas e metodologias para a adesão de mais países ao maior bloco político e econômico do mundo. Sua eficiente maneira de integrar países vizinhos mais pobres é um exemplo para outros blocos. A livre circulação e melhoria na qualidade de vida dos cidadãos dos países-membros já é uma realidade.

Os perspicazes relatos dos países me atraíram muito, acredito que o fato do autor ter viajado para mais de 100 países contribuiu bastante para a qualidade dos textos. Em especial, gostei de ler sobre a Líbia, Cazaquistão e Malásia, países que eu não conhecia muito a respeito, mas que me surpreenderam por suas qualidades e políticas assertivas. A Líbia, apesar de ser considerada país terrorista pelos EUA, possui a maior renda per-capita da região, atraindo pessoas do Marrocos, Egito e Tunísia. O Cazaquistão, que destoa de todos os outros países istões, se assemelha com a Turquia ao possuir a chamada política multivetorial, característica quando um país se relaciona bem com outros Estados antagônicos. Seus oleodutos, comparados pelo autor com cabos de fibra ótica como vestígios invisíveis da globalização, estão garantindo crescimento econômico e deslocando o eixo de relações da Rússia para a China, que por sua vez tem investido maciçamente no setor energético cazaque. Khanna também aborda a questão da religião e sua relação com os países, sendo a Malásia um caso exemplar, onde o islamismo é considerado moderado e não interfere negativamente na vida das pessoas. A Malásia é também um exemplo de gestão econômica moderada – protegendo dos excessos que o capitalismo pode provocar - que deu certo e os frutos, garantidos pelo crescimento econômico, estão sendo colhidos.

As análises sobre o Brasil e sua relação com as superpotências são verdadeiras e profundas, mas às vezes um pouco exageradas. O autor comentou sobre a produção e utilização do etanol como combustível para veículos, constituindo um exemplo para diminuir a dependência de combustíveis fósseis. Abordou também o crescimento econômico que não é dividido igualmente entre os cidadãos, criando condições para o florescimento da violência e crime organizado. Porém, relatou de maneira exagerada, que pessoas da alta sociedade não podem ficar tranquilas nem em restaurantes xiques, õque suas bolsas podem ser roubadas a qualquer momento. Achei também que faltou abordar mais sobre o Mercosul, e já que este bloco não ocupa posição de destaque no mundo ou seja exemplo de acerto, haveria motivo e lugar para críticas e comentários.

A falta de capítulos destinados à Africa do Sul e Índia também me surpreenderam. Acredito que a frustração do autor com sua terra natal, mesmo esta tendo atingido elevados índices de crescimento nos últimos anos, o tenha motivado para excluí-la injustamente do livro. Gostaria de saber mais sobre a complexa e atritante relação diplomática entre Índia e China, já que a última foi considerada no livro uma das três superpotência globais. Já sobre a África do Sul, gostaria de saber como se dá a relação das potências com este país, visto que ele se situa, de maneira geral, igualmente distante das três. A contrário do que foi comentado por um blogueiro, a maneira superficial com que os países da América Latina, em comparação com os da Ásia Central ou Oriente Médio, foram analisados, não me surpreendeu. Acredito que os países asiáticos possuem elementos chave muito mais interessantes que tangem temas como globalização, religião, geopolítica e acelerados crescimentos econômicos.

Ao ler o livro, a mensagem é clara: a estratégia energética desempenha hoje um papel ainda maior na globalização e relação entre Estados. Da mesma maneira que reservas energéticas podem salvar um país, é possível, através de gestão ineficiente e corrupção, que esta dádiva contribua para a total destruição democrática e social de uma nação. É este o caso da Venezuela, membro da OPEP que, admiravelmente, enfrenta hoje racionamento de água e energia. Ficou evidente também que a política externa dos Estados Unidos não tem trazido resultados positivos, e a imagem deste país no mundo, sobretudo no Oriente Médio, está casa vez pior. O autor ainda enfatiza, que se a atual maior potância do mundo não tomar cuidado e inverter o jogo, é provável que descambe para o segundo mundo. Sem contar que quando o livro foi escrito, a crise mundial financeira, que abalou principalmente os EUA, não havia eclodido ainda. É preciso tomar cuidado, a geopolítica é um constante jogo sem fim onde os times revezam a liderança.

Nenhum comentário:

Postar um comentário